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quarta-feira, 15 de maio de 2013

Um conselho


Você deveria esquecer que tropeçou, que machucou o dedão e aquilo fez doer. Quando te chamarem pra correr pela rua até o próximo quarteirão, na esperança de encontrar o senhor vendendo algodão doce, não perca tempo procurando seu sapato, muito menos amarrando o cadarço que o manterá firme em seus pés. Permita-se ser puxado pela mão que te espera no portão e não tenha medo de seguir descalço.  Corra e ganhe velocidade a ponto de quase poder voar. Se quiser voar, voe. Mas antes sinta como é bom poder tocar o chão sem aquele medo antigo de calejar, de se cortar e sentir dor.

Perceba que sujar os pés em busca de algo que faça seus olhos brilharem é tão gratificante quanto descobrir, depois de dobrar em tantas esquinas, que o vendedor de algodão doce, por algum motivo, estava esperando por você. Pelo sabor da conquista, aquele algodão será o mais doce e derreterá na sua boca, te arrancando um arrepio gostoso que percorrerá todo seu corpo. Experimente um de cada cor, mesmo que o seu preferido seja o azul-cor-de-céu-aos-domingos.

Você irá se sentir vivo e agradecerá aquela mão que te puxou rua afora, te conduzindo para esse momento de pura satisfação. Agradecerá por ter deixado os sapatos em casa e o medo embaixo dele. Ao voltar, com as mãos grudadas pelo açúcar colorido que restou nos dedos, saberá que o coração já não é mais o mesmo. As batidas descompassadas, pulsantes pelo sangue novo que passeia pelas artérias, irão mostrar o ritmo com o qual deverá conduzir cada sorriso e cada gesto a partir de então.

É, meu caro, jogue os sapatos fora! Esqueça os medos, os planos, os riscos e as velhas promessas. Jogue fora os sapatos e, se a vaidade assim não permitir, escolha os chinelos, mas não se esqueça de esquecê-los por aí na primeira oportunidade que encontrar para sentir-se livre e feliz.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Sobre ser racional


Ainda não sei o que sinto ao perceber estar do lado mais racional de nós dois. Logo eu que sempre vivi à flor da pele, sendo emoção pura a cada instante, ainda não sei em que momento desativei o botão “pulsar” do meu coração e deixei que meus medos criassem uma barreira quase impenetrável para evitar que você se aproximasse, armado de segundas e terceiras intenções. Se te recuso os convites, é pra tentar proteger as boas lembranças que restaram de nós. Ainda que inocentes, percebo a centelha de esperança escondida nos seus olhos, pronta para reacender a qualquer sinal de que minha resposta soe como um sonoro sim.

Eu que nunca aprendi a dizer não, descobri que ficar em cima do muro talvez seja a solução mais sensata para não te machucar. Hoje eu quero estar ocupado o suficiente para que não me reste tempo algum. Quero me esconder atrás dessa barreira que você ajudou a levantar, cercado das tantas obrigações que impus a mim e que me impedirão de aceitar que sua mão segure a minha por debaixo da mesa enquanto o sorvete não chega.

Mais uma vez eu não sei como agir na sua presença, como quando começamos a nos conhecer e minha timidez exagerada não me permitia te olhar fixamente por muito tempo. Hoje eu já não sei se é melhor acreditar que você vai, aos poucos, entender a nossa situação do meu ponto de vista, ou se te ignoro, numa brusca tentativa de fazer com que a ficha caia de uma vez. Logo eu que sempre fui tão coração, não me reconheço ao perceber em mim tamanha vontade de arrancar de você esse restinho de sentimento que eu mesmo plantei; semente de um amor que não brotou.
            

terça-feira, 7 de maio de 2013

Nossa História


       
Faltaram motivos, uma dose de coragem e, quem sabe, um pouco daquela velha esperança que sempre resta antes que o fim seja, de fato, o fim. Acho que ela resolveu partir antes mesmo que cogitássemos a possibilidade de escrever um novo começo. Um re-começo de uma história que começou borrada de euforia, tão turva de expectativas acumuladas anos a fio, que nem se quer nos demos conta de que havíamos dado um passo tão largo, que nos fez subir dois ou três degraus de uma única vez.

Eu queria poder ter uma carta na manga, um truque que fizesse as coisas tomarem o rumo que deveriam tomar quando nos imaginamos parte de um todo preenchido apenas por nós dois. Um truque barato, que seja; qualquer coisa que me fizesse acreditar ser mais capaz e dizer “tudo bem, vai passar”, e sair com você de mãos dadas rumo àquela casinha cor-de-rosa que você tanto insistiu para que visitássemos um dia.

Não fui capaz e não me sinto capaz. Não acredito que querer é poder. Querer apenas é pouco; pouco demais. É preciso sentir. Sentir hoje, amanhã, depois e depois de amanhã e perceber o querer tornar-se um uma necessidade incontrolada a ponto de doer o peito, tamanha a falta. Perdão se meu querer foi vencido pela minha inconstância e essa tal necessidade tenha permanecido nos limites da sanidade. Nossa história não é sobre gostar ou não gostar. Nossa história é sobre perceber que os degraus ignorados por nós fizeram falta, de maneira que nem mesmo descendo a escada mais uma vez seria possível subi-los como um dia planejamos.

Longe de mim parecer insensível, ou egoísta, ou um canalha sem coração. Longe de mim ignorar os bons momentos que passamos juntos e jogar tudo isso embaixo do tapete. Você gravou sua marca em mim da maneira mais sutil e delicada, num reflexo da sua fragilidade que tanto me causou espanto, da qual eu tive medo e não soube lidar. É que faltou coragem em doses exageradas e também uma pitada daquela velha esperança de que o amor um dia iria vingar.